sábado, 26 de outubro de 2019

7-PADRÃO ÉTICO

7-PADRÃO ÉTICO

Não bastará um século para produzir uma cabeça igual à que se fez cair num segundo.
(Lavoisier) 

Tive um sonho esquisito. Não é o primeiro que me serve de inspiração compositora. Sonhar sempre foi muito importante para a criação de meus textos. Sou um ateu, assim como Freud, mas diferente dele, de Augusto Comte e outros como Lévi-Strauss, segundo Richard Webster, procuro desvincular-me de toda forma de misticismo.

Embora já tenha lido António Damásio, não consigo deixar de gostar de certas histórias e personagens como anjos, elfos, vampiros e magos, os que mais gosto depois do Spider-man, Superman e outros super-heróis como Static Chock, além, é claro, do Héracles grego, da figura de Osíris e do Dioniso segundo Nietzsche e Deleuze.

Vamos ao sonho. Disporei tudo aquilo de que me lembrar. Voltando ao máximo de minha memória de trabalho, como descrita pela neuro-ciência, aquela que lembra fatos muito recentes sob o funcionalmente de quem dependemos, por assim dizer, para criar um texto como esse.

Eu andava por um caminho largo, deserto e ao mesmo tempo repleto de árvores ao redor. Uma das poucas vezes que consegui desenvolver um cenário totalmente original, geralmente não consigo imaginar fisicamente, ou em 3d, como preferiria Carl Sagan, aquilo que não conheço de fato.

Uma grande deficiência para alguém que adora "filminhos de boneco", como diria um dos meus tios, e filmes bem fugidios às realidade; como "Matrix", que fez de Neo um dos meus muitos heróis-imaginários dos quais, de algum modo, desejei ser, mesmo que por um segundo.

O fato de me encontrar ali fora para ajudar uma cunhada a colar umas figurinhas, com as quais ela preenchia um álbum. Eu atrapalhava, querendo ajudar, ou por brincadeira. Colei a última, ao que ela disse: _Não. Essa eu não conseguirei colar!

Fiquei sem compreender até ver um ônibus em que ela quis colar figuras iguais às de seu álbum, numa versão ampliada. Inconscientemente, talvez, eu sabia que se ela mesmo colasse, iriam nos confundir com os estudantes que lotavam o ônibus -escolar em movimento.

Então, pagamos a três dessas crianças-tripulantes para que completassem para nós essa espécie de missão. Depois de realizada a colagem perguntei:_Vocês vão de carona ou a pé?_As figuras coladas formavam uma paisagem muito verde. É estranho, sei o que representava a imagem de forma conceitual, abstrata, sem, entretanto, conseguir recriá-la por inteiro em minha mente; o nome convencional que damos para esse emaranhado de pensamentos, das sinapses aos filamentos.

Senti que iria revelar naquela hora um segredo, quando minha cunhada respondeu:_Eu vou por minha conta e risco!_ Senti algo estranho naquele "conta e risco". Ela falara assim para que meus poderes de blud-elf não viessem à tona, todavia, para chegar a outro local onde deveríamos estar logo, só haveria um meio: voar.

Não consigo me lembrar dos rostos nem dos corpos de nenhum dos estudantes. Tudo que sei é que suas camisas eram brancas e o ônibus, que outrora os conduzira, amarelo. Tínhamos que ir a um lugar no mapa que eu segurava. Era um acampamento daqueles que só vi pela T.V., através de filmes e documentários.

Como os estudantes não respondessem ou eu não me conformasse com a resposta dada, pus-me a levitar, revelando assim minha real personalidade. Levantei as duas mãos a concluir um encantamento que nos permitiria voar bem alto e veloz.

Não sei se falei em Latim, coisa pouco provável, uma vez que conheço pouquíssimas palavras em Italiano. Mas, no sonho tudo vale. Voamos alto,e por incrível que pareça, seguíamos por baixo da fiação cinco vezes mais elevadas ou mais que a real.

Avistamos uma criança de suposta má-conduta fugindo, quando afirmei:_Seu caráter pode ser reformado, pois ainda não está totalmente criado.

Daí, já no chão, alguém pronunciara algo sobre meu avô estar bêbado, quando na realidade ele não costuma beber, e alguém ter batido nele, quando me intrometo: _Quem foi?

O cara olha pra mim e diz: _ seu avô está ali._ O encontrando, conduzo-o para minha casa, ajudado por um primo que surgira do nada, mesmo ele dizendo que só iria quando o meu irmão fosse buscá-lo. Sem mais nem menos, chorei tanto que meu primo, irritado, deixara meu avô por minha conta e andara agora às pressas; talvez pra chamar meus irmãos.

Falei pro velho: _Você é meu padrão-ético._Lágrimas escorriam pelo meu nariz abundantemente, enquanto em pensava: _Será que é ou fora?

Agora, o que vem mesmo a ser um padrão-ético? Como nunca ouvi essa expressão, penso que seria algo ou alguém que eu imite como parte integrante de minha personalidade. Mas, quando o espelho quebra e não conseguimos substituí-lo? Algumas coisas em que críamos antes e não fazem sentido hoje perdem o poder de nos guiar. Mas, será mesmo que precisamos de outro cão-guia quando deixamos de ser cegos?

A cultura, em muitos aspectos, é isso, uma estrada em que somos levados por cão-guia, cuja coleira soltamos quando se torna inútil. Nossos espelhos pessoais podem quebrar, todavia, nunca de forma total, em nosso caráter, se extinguirá. O cão pode voltar-se contra o dono numa batalha em que um morra e o outro saia com sequelas, e mesmo assim seguiremos a voz dos nossos espelhos, ou seja; aqueles que antes de nós já caminhavam com autonomia, ou assim nos pareceu algum dia.

Um dos meus amigos me serve de espelho-intelectual, e por conversas com ele meu interesse por assuntos filosóficos iniciara, ou pelo menos aumentara de forma considerável, durante minha infância. Até virei ateu como ele, embora isso eu viesse a ser por questões pessoais independentes das nossas longas conversas de sempre.

Eu nunca fiquei sem um "referencial masculino", como minha mãe pensa ainda hoje. Tenho meus dois irmãos e esse meu amigo, que também me serve de espelho intelectual, embora minha mãe se encontre na base deste, e minha irmã, em seguida.

Meu espelho de homem é meu avô materno. Espero, um dia, ser parte de tudo aquilo que ele representa pra mim. Ele é meu alicerce moral, pelo menos nessa questão de odiar a mentira. Essa é uma questão, dentre poucas, nesta vida curta e disparada, que nunca mudou em mim. A busca pela verdade é ainda meu parâmetro daquilo que entendo por ser um pensador, um mero ser pensante neste universo imenso no qual sou simples, e insignificante, parte de poeira-estelar de alguma forma viva.

Por mais que nos afastemos da cultura, rotina quase vital de um bom pensador, por isso tento piamente, certos aspectos dela não morrem; a não ser quando a memória se esvai, formando parte de nossa identidade. Acima de qualquer valor místico, buscamos incansavelmente um padrão-ético, que muitas vezes já temos sem nos darmos conta de onde ele está fisicamente falando. Mas, eu sei onde está o que sigo e com quem mais pareço.

Quem sabe, alguns sonhos tenham significado profundo, afinal, embora que o modo de Freud esteja errado e venha senso implantado pela dita "Psicanálise". Nem Freud e nem outros pensadores, ateus ou não, como Darwin e Einstein, conseguiram fugir de seus padrões-éticos e de suas condições sociais em cada época.

Para mim, de todos os pensadores, um está à frente: Lavoisier, embora eu não goste de Química. Apenas ele provou a Lei inquestionável da ciência. Não é preciso conviver diretamente com as pessoas para que estas nos sirvam de modelo.

Lavoisier é o meu segundo padrão-ético. Uma espécie de avô-intelectual que infelizmente não conheci, nem poderia, por culpa da finitude aparente da matéria em transformação, que, inclusive, forma meu pensamento e meu apego pela verdade; que é a própria matéria. A contra-gosto de Kant, a verdade existe sim e é simples.

As figuras míticas, para conclusão deste texto, não morrem, porque também nos servem de padrão. Uma vez que gostamos da história, desejamos ser fortes e corajosos como Quasímodo, Asterix e Arsène e acabamos por odiar seus inimigos; no caso aqui estabelecido, o clero e os romanos, incorporando a coragem desses três personagens e de tantos outros dos gibis, HQ's, desenho-animado, literatura, música, filme ou outras expressão artística qualquer.

A arte nos aproxima desses mitos e lendas. Psicologicamente falando, não precisamos nem ter o contato direto com esses mitos para lhes copiar os valores, basta que alguém nos conte uma parte da história de forma admirável ou de forma que tiremos do protagonista algo de valor social; como coragem, lealdade, etc., e logo agiremos como Sherlock Holmes, James Bond ou Bruce Lee.

Parafraseando a Lei de Lavoisier: Nas sociedades, nenhum valor se cria, nenhum valor se perde, todos eles se transformam. E nós copiamos, por mais originais que pareçamos, os valores de alguém; seja ele um parente próximo, um amigo imaginário, se é que isso existe, ou um herói longínquo; real, como Vercingetórix ou forjado, como Sigurd.
Ateu Poeta

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